CRISE CLIMÁTICA

Argumentos e emoções para os brasileiros se importarem com essa causa

Clima já não é apenas papo de cientista ou conversa de elevador

A crise climática, antes vista como distante, agora é uma realidade próxima. No entanto, como tornar essa ameaça uma prioridade nas preocupações públicas e motivar os brasileiros a agir cotidiana e politicamente?

Com os desastres ambientais que aconteceram em 2023, com o início da COP28 e com a ameaça crescente de exploração de petróleo na Amazônia, para esse episódio de Como Falar Sobre o nosso assunto é Crise Climática. Dialogamos com jovens, conservadores e progressistas, afinal são eles que mais provavelmente enfrentarão as consequências dessa catástrofe em suas vidas e são eles os mais propensos a gerar as mudanças necessárias.

 

OPORTUNIDADES

 
 

1. Apresentar soluções concretas é uma necessidade

É comum que o sentimento de urgência com relação à crise climática se misture com a sensação de impotência, de querer agir e não saber o que fazer.

"Precisamos fazer algo, mas o quê?"

Para aplacar a “ecoansiedade”, é fundamental a mensagens que mostram o que as pessoas podem fazer para enfrentar a crise (individual, e principalmente coletivamente). Conteúdos assim são bem-vindos, desejados e necessários. Pressionar empresas, cobrar políticos e protestar são respostas concretas nesse contexto.

2. O calor é um alarme

Os jovens sabem que a crise climática gera uma miríade de efeitos catastróficos: enchentes, deslizamentos, elevação do nível dos oceanos, ciclones, seca, etc. Mas entre todos eles (com a ponderação de que rodamos essas conversas em semanas esturricantes no Brasil), o calor parece a consequência mais imediata. Embora não seja percebido como uma catástrofe em si, o calor é um incômodo que serve de sinal de alerta. O calor excepcional confirma a ideia de que há algo fora de ordem, um presságio de que males maiores estão por vir se não fizermos algo. O calor é definitivamente uma janela de persuasão e mobilização.

3. A Amazônia é nossa!

Progressistas e conservadores concordam que é nosso dever proteger a Amazônia. A ideia da Amazônia como um patrimônio brasileiro, um tesouro, o "pulmão do mundo" que precisa ser guardado esteve presente em todos os grupos. Agora, tem uma armadilha aí: conservadores levantaram com frequência suspeitas dos interesses internacionais escusos envolvendo a Amazônia. Exagerar no patriotismo amazônico pode elevar a rejeição de iniciativas internacionais legítimas que visem a contribuir com a proteção da floresta.

4. Bichos!!!

A destruição de mil árvores, embora significativa, não desperta tanto impacto emocional quanto a imagem de um único animal sofrendo devido à crise climática. Esta observação não é exatamente nova para quem é da área, mas o que notamos nos diversos grupos é um profundo senso de injustiça: os animais são vítimas inocentes das ações humanas. Ao evidenciar o quanto as mudanças climáticas já estão afetando seres completamente vulneráveis, conseguimos gerar uma poderosa reação emocional em pessoas de diferentes perfis.

5. Poucas diferenças entre conservadores e progressistas

Conversamos com dois grupos que votaram em Bolsonaro em 2018 e 2022, além de dois grupos que votaram no PT em ambos os pleitos e tivemos uma grata surpresa: a crise climática é uma preocupação de todos esses jovens. Eles estão cientes desse problema, têm poucos pensamentos divergentes e o mais importante: estão à espera de um plano de ação.

 

TRETAS

 
 
 

1. A armadilha das saídas individuais

Anos e anos de propaganda colocando o cidadão comum como agente (co-)responsável pela crise ambiental surtiram efeito. O primeiro impulso dos jovens na hora de pensar em responsabilidades e soluções é pensar no seu papel individualmente: banho curto, reciclagem, reaproveitamento etc. Acreditam demais no mote de que pequenos hábitos podem mudar o mundo.

“Não é sobre o que o outro faz, é sobre minha ação no mundo: o que eu posso fazer de diferente?”

Entendem que todo mundo tem sua parcela de culpa na crise, mas não levam em consideração a proporcionalidade. Essa dificuldade em reconhecer o papel prevalente das grandes corporações e do governo é um dos grandes desafios na hora de conversar com públicos menos politizados.

2. Ainda não é prioridade na hora do voto

Não é surpresa, mas clima ainda não é um tema prioritário quando a pergunta é "quais assuntos te mobilizam a votar?". Meio ambiente até aparece na lista, mas nunca chegando ao topo do ranking. Ao final das sessões, após conversarem e assistirem a conteúdos, o tema sobe algumas casas de importância - o que é natural e tende a acontecer com qualquer assunto.

O que há de diferente aqui é que a consciência sobre a importância das questões climáticas é acompanhada de um forte impulso para ação, isso não acontece com qualquer causa. Se clima é importante, então é necessário fazer algo a respeito (isso não acontece tão fortemente em outras agendas: educação, saúde, economia…)

3. Veganismo e vegetarianismo não aparecem espontaneamente

Apesar do grande enfoque em questões individuais para enfrentar a crise, apesar da sensibilização diante da causa animal, a diminuição ou o fim do consumo de carnes não surgiu como proposta de soliução do problema.

 

CURIOSIDADES

 
 

1. Negacionismo não apareceu!

Conversamos com dois grupos de jovens que votaram em Bolsonaro (em 2018 e 2022) e a questão de que o aumento da temperatura global seria um fenômeno natural e, portanto, não relacionado à ação humana simplesmente não apareceu.

2. Há um choque claro entre passado e presente

Antes, o clima não era percebido como problema, era uma constante, um não-assunto ou uma simples e conversa de vizinhos. Hoje, o clima é símbolo de instabilidade e de desordem.

“O clima tá maluco.”

Os jovens têm noção de que uma situação catastrófica pode estar no seu horizonte de vida. Sobre isso, vale notar que a crise climática foi mais associada a eventos extremos acontecendo com maior frequência (secas, enchentes, ciclones) do que propriamente com seus efeitos nocivos no cotidiano da população (escassez e/ou encarecimento de alimentos, problemas de saúde etc.). Associar mais a crise a eventos do cotidiano pareceu um bom caminho de sensibilização.

Metodologia

Foram realizados 04 grupos de discussão on-line com pessoas interessadas nas temáticas de Meio Ambiente, desenvolvimento sustentável e mudanças climáticas, moradoras de Belo Horizonte e Salvador. No total, a pesquisa contou com 02 grupos com mulheres e 02 grupos com homens, todos com idade entre 16 e 24 anos, com ensino médio completo e das classes CD, totalizando 28 pessoas ouvidas nos dias 15 e 16 de Novembro de 2023.

Os grupos foram organizados a partir da autodeclaração sobre orientação política, divididos da seguinte forma:

  • 02 grupos de progressistas - 01 grupo de mulheres e 01 grupo de homens que se autodeclaram de esquerda, votaram em Fernando Haddad no segundo turno das eleições de 2018 e em Lula, no segundo turno em 2022.

  • 02 grupos de conservadores - 01 grupo mulheres e 01 grupo de homens que se autodeclaram de direita, e votaram em Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018 e 2022.